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Crônica publicada na Gazeta do Ipiranga* - Edição nº 2590, comemorativa de 51 anos do Jornal.
Maio de 2009.
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Que alegria comemorar 51 anos! Uma alegria maior ainda se considerarmos que, hoje em dia, 50% das empresas descem suas portas antes de completar 5 anos de vida.
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E os romances, então? Quantas uniões você conhece com mais de 50 anos de existência, que já festejaram bodas de ouro como nós, do GI? Muito poucas, eu aposto... Você sabe como é feito um jornal como o GI? Se sua resposta for: com papel, tinta e máquinas impressoras, tenho que lhe dizer, amigo leitor, que você errou. Um jornal é feito com muito mais do que isso! É feito de carne, ossos, sangue, suor, lágrimas, amor, paixão, sufoco, persistência e garra, muita garra! É matéria humana, amigos! Gente que se entrega de alma aberta à dura, porém gratificante tarefa de apresentar a você um produto de qualidade, que informe, divirta e emocione. Você sabe quantas facetas têm um jornal? Não lhes responderei, simplesmente! Devo contar-lhes uma história. Afinal, para que serve um cronista? Pois vamos a ela!
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O jornal sempre fez parte da minha vida. Lembro-me de ver meu pai lendo-o todo o santo dia. Admirava aquela sua habilidade de, em incríveis dobraduras aéreas, manusear suas folhas de desajeitadas dimensões sem deixar precipitar nenhuma.
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Lá em casa os jornais velhos que iam se empilhando num canto na nossa área, viravam forração para a gaiola do nosso hamster e passarinhos. Algumas vezes eu, menino, inventava brincadeiras com eles: capuchetas, chapéus de pirata...
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Anos depois, quando a vida da gente apertou, minha mãe passou a vendê-los amarrados em fardos para os carroceiros lá do bairro, acúmulo dos nossos periódicos e dos que os vizinhos abandonavam na lixeira do prédio. Momentos felizes, momentos tristes... e o jornal sempre presente!
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Lembro-me de um dia em especial. Desci do meu Chevette verde. Rua Anita Ferraz, bairro do Glicério, aqui pertinho, 7h30 da manhã. Frio danado, dia escuro e chuvisco gelado. Era o inverno de 1996. Eu vestia terno e empunhava uma pasta. O cliente me aguardava naquele sobrado encardido logo ali. Firma de locação de britadeiras.
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Logo que pisei nos paralelepípedos úmidos, vi o jornal. Era um jornal inteiro e trazia notícia ruim... Jazia bem no meio da ruela, aberto folha a folha e distribuído sobre um volume de 1,70m.
Parei e olhei-o durante algum tempo. Ficamos em silêncio respeitoso por um minuto, eu e o jornal. Não havia ninguém por ali além de nós.
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Atravessei a rua passando ao lado dele. Anunciei-me pelo interfone no umbral da porta. Garoava fino sobre nossos corpos, o meu e o do jornal.
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Um estalo seco e metálico liberou minha passagem. Dei uma última olhada antes de avançar por um corredor estreito e subir uma escadaria escura.
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O jornal ficou lá, sozinho.
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Cesar Cruz
Maio 2009
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* créditos dos parceiros no rodapé do blogue.
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