Acabe logo com isso, bem.


senhor por favor não faça perguntas nem me interrompa. Vou contar a história toda, garanto que valerá a pena esperar. Acontece que já não consigo mais dormir. Arrependimento por ter feito a coisa errada, castigo de Deus, suponho. O que sei é que vim fazer o que já deveria ter feito faz tempo. E vocês, que são a Lei, que decidam o que fazer comigo.

Então eu estava lá, esperando. Era domingo, e ele entrariam de carro pela garagem, de forma que o garagista poderia inclusive testemunhar isso. E, no resto do dia, não sairiam. “A dona Ângela chamou até comida chinesa a noite pra eles”, diria o funcionário do turno da tarde, frente a um interrogatório policial.

O prédio deles só tinha funcionários na garagem, em sistema de turnos, e a combinação do testemunho de cada um, numa improvável convocação, reforçaria que de fato seu Edgar e dona Ângela entraram e não saíram de casa no restante daquele domingo. “Eles só saíram mesmo foi na segunda de manhã, os dois sim senhor, de carro, eu mesmo vi”, diria o tal do Orlando, o cabeça de jaca do turno matinal. O senhor sabe, pobre adora essas declarações categóricas, que mostrem a sua seriedade e conhecimento de causa no cumprimento do serviço.

Do jeito que planejamos, ainda que se caçassem evidências e depoimentos contrários, a Ângela estaria amparada por um álibi forte, já que o sumiço do marido só se daria oficialmente na terça pela manhã, 24 horas após ele ter deixado ela no trabalho, com todo mundo a vendo descer do carro e dar tchauzinho pra ele, enquanto o automóvel se afastava.


O mais difícil não é matar, é sumir com o corpo. O senhor sabe, os melhores crimes acabam sendo descobertos porque aparece um osso, uma cabeça num saco, uma mão boiando no Tietê, uma ossada desenterrada por um jardineiro, ou por um cachorro. Se fosse fácil sumir com um corpo inteiro, sem deixar vestígio nenhum, ia ser a bancarrota das seguradoras.

Fiquei no apartamento desde a noite da sexta quando eles viajaram para tratar de um imóvel da família em Ribeirão. Dormiriam lá na cidade, na casa da mãe dele, e no sábado iriam ao cartório local assinar uns documentos, depois visitar o imóvel. Pernoitariam de novo do sábado pro domingo na casa da velha e finalmente voltariam a São Paulo. Foi golpe de gênio. Bolamos todo o plano no detalhe, casado com a viagem. Estudamos todas as possibilidades. O passo-a-passo estava na nossa cabeça de trás pra frente. Ensaiamos cada fala várias vezes, sempre contando com a possibilidade de imprevistos. Tínhamos saída para qualquer surpresa.

No início da noite daquela sexta ela fez que ligou para uma pizzaria. Esse era o passo número um da operação. Ele vendo TV espichado no sofá e ela dizendo, olha, capricha na cebola da calabresa que dá outra vez veio quase sem, viu?, e o telefone buzinando tu, tu, tu, tu, tu na orelha dela, ninguém do outro lado, e ela dizendo o endereço e a referência para um atendente imaginário. Olha, vai demorar muito? Eu e meu marido temos que pegar estrada daqui a pouco!

O entregador era eu. Cheguei com a pizza, que fui comprar em outro bairro para não haver perigo de futuras correlações. Apertei, com a caneta, o 24 no interfone da rua. Ela atendeu. Boa noite, eu disse, entrega da pizzaria. Pode subir, segundo andar, ela falou, apartamento 24. Ouvi o cleck do trinco, empurrei a porta com o ombro e entrei no hall. Subi as escadas e toquei a campainha do apartamento. Ela abriu e nos olhamos, olhos nos olhos, nervosos. O plano tinha sido posto em ação, agora era como um pneu largado ladeira abaixo. Não dava mais para conter. Vi pelo vão ele no sofá da sala vendo televisão, rindo sozinho de alguma besteira. Baixo e magro, como nas fotos. Olhando ele ali assim, meio bonachão, as perninhas finas de fora, não me pareceu o cara que bate na mulher, bruto. De qualquer forma, o que mais tem por aí é lobo em pele de cordeiro.

Ela pegou a pizza e me passou uma folha de caderno dobrada, fique com o troco pra você, ela falou, os olhos querendo dizer um milhão de coisas. Para sair é só destrancar a porta no botão que tem logo ao lado. Obrigado, eu disse, uma boa noite. Trocamos piscadelas.

A folha de caderno dizia "Eu te amo, vai dar tudo certo, seremos felizes!" Desci ao térreo, apertei o botão com o cotovelo destrancando a porta, puxei com um pano e larguei, a mola hidráulica empurrou de volta até travar, produzindo um eco de metal e vidro na galeria, garantindo que o entregador já teria ido embora.

Subi novamente pelas escadas e me posicionei um andar acima do da Ângela, entre o 2º e o último. Se alguém saísse para jogar o lixo, eu subiria ou desceria, dependendo da necessidade. A luz automática se apagou e eu permaneci quieto ali, por quase duas horas. Sei ficar imóvel pelo tempo que for necessário. Sei até reduzir os batimentos cardíacos, se for preciso. No Exército, na Divisão Especial, se aprende a controlar essas coisas. Ansiedade, nojo, medo, fome, dor, nada disso existe para um Boina Verde como eu.

Cerca de uma hora e meia depois, ouvi a chave ser passada no trinco e passos escada abaixo. Calcei as luvas de borracha e, usando a cópia da chave, entrei.

A noite daquela sexta foi de cuidadosa investigação no apartamento. Não resisti à curiosidade. Mexi em todas as gavetas e armários. Acabei me aborrecendo com a vida deles. Fotos na praia, objetos, roupas, enfim, mal ou bem, uma história construída. Me emputeci com aquilo. Sem poder sair nem fazer barulho, matei o tempo vendo televisão com o som bem baixinho, deitado na cama de casal, tomando os uísques do meu sócio, que iria mesmo parar de beber. Eram sei lá que horas quando peguei no sono, estava exausto.

4h. Sonhei com floresta e chuva. Acordei sem saber onde estava, um puta susto até as ideias se juntarem. Voltei a dormir, um sono instável.

8h. Acordei. Fiz um café e comi com pão. Limpei e lavei tudo e repus nos armários, sempre de luvas.

13h. Para almoçar, esquentei no forno uma lasanha dessas prontas que achei no freezer. Assisti mais TV.

16h. Cochilei e acordei suado. As luvas estavam me matando de calor. Tirei um pouco, depois coloquei de novo.

19h. Comi uns queijos, tomei umas cervejas e assisti a uma comédia muito boa no canal a cabo.

22h30. Tomei banho e fui dormir.

Domingo – 6h. Acordei com o despertador do meu relógio. Fiz qualquer coisa para comer.

9h. Eu já não aguentava mais. Um calorão daqueles no apartamento todo fechado, janelas e cortinas. Lá fora um baita sol, mas eu não podia abrir nada. E a Ângela que não ligava. Preparei um Buchanan's com bastante gelo e fui pro chuveiro. O tal do Edgar só gostava de uísque bom. Sorte minha. Pus o copo no beiral do vitrô, as pedras dando estalinhos, e deixei a água cair nas minhas costas e fui me ensaboando, cantando uma da Bethânia. De repente tocou meu celular em cima da privada. Só podia ser ela. Desliguei a água, corri a porta de vidro e atendi com as pontas dos dedos molhados. Era ela de um orelhão lá em Ribeirão.

Miguel, tenho que falar rápido, saí dizendo que ia só abastecer o carro. E aí?, perguntei. Seguinte: resolvemos tudo ontem, mas agora minha sogra insistiu em preparar um café. Vamos tomar e sair logo, prometo. To pondo pressa. Pode calcular que umas 15h no máximo estamos chegando, está ouvindo, meu amor? Ouvi sim, eu disse. Não tire as luvas!, ela falou. Pode deixar. Fica tranquila que hoje isso se resolve, falei. Deus te ouça, ela disse, amo você, bem, e desligou. Abri a água de novo e fui bebericando na bordinha do copo. Gosto de um aperitivo debaixo do chuveiro.

O corpo de um homem adulto tem em média 6 litros de sangue. Talvez o pior de um defunto é essa liquidez toda. Se fosse seco as coisas seriam mais fáceis. Sangue é o maior B.O que existe, pior que batom na cueca. Caixão e vela preta. Uma micro-gota que seja num canto qualquer acaba com o sucesso de qualquer crime, conforme o senhor sabe, melhor do que ninguém.

Sempre pensei que uma maneira inteligente de drenar um corpo seria fazendo furos em diversos pontos e deixar vazando, livremente, dentro de um box, por exemplo, com a água aberta, diluindo tudo, carregando pro esgoto, pra se misturar com merda, mijo e chorume. Depois, azulejos bem lavados com cândida, umas três vezes seguidas, não guardam nada. Nem a polícia científica borrifando Luminol consegue achar vestígios de sangue. Daí comecei a pensar que o esgoto é a grande sacada. O negócio é fazer tudo virar sopa.

A manhã do domingo demorou pra passar. Fiz e refiz o plano na cabeça setecentas vezes. Fiquei tentado imaginar como seria na hora que eles entrassem, cada passo, as coisas que poderiam dar errado, as inúmeras possibilidades de reação dele. E se ele viesse pra cima de mim e eu tivesse que meter uma bala nele ali mesmo, no meio da sala? Estaria tudo perdido. A Ângela garantia que isso ele não faria de jeito nenhum.

Finalizei a garrafa de Buchanan's pensando em cada uma das bostas que poderiam acontecer. Umas 14h tocou o interfone. Tomei um puta susto. Respirei fundo e por uma fresta da cortina vi uns moleques correndo, gritando. Moleques filhos da puta.

14h30. Me sentei na cadeira da cozinha e fiquei ali, debruçado sobre a mesa, de testa no antebraço e olhos fechados, relaxando um pouco. Teria muito trabalho, precisava estar descansado.

15h20. Nada. Tomei um copo d’água bem cheio e dei uma mijada, com medo deles chegarem bem naquela hora. Voltei pra cozinha.

16h - Levantei e andei um pouco pela casa. Rosqueei e desrosqueei o silenciador da 6.35.

Minutos depois ouvi ruídos nas escadas. Os sons foram se aproximando, mas ainda poderia ser algum morador do andar de cima ou o vizinho da porta da frente. Então ouvi a voz dela, um riso curto dele. Chave na porta. Entraram. Me recostei na geladeira.

Ele entrou primeiro e foi direto pra cozinha. Colocou um pacote na mesinha e, quando levantou a cabeça, deu de cara comigo. Soltou um guincho de susto e branqueou na hora, os olhos escuros, sem pupilas. Eu estava com a arma apontada pra cara dele, o indicador da outra mão na frente dos lábios, exigindo silêncio.

Pelo amor de Deus, ele falou, baixinho, num sussurro cúmplice, pondo uma mala no chão e, com o braço, mantendo a Ângela atrás de si. Assim, assustado, parecia um homem bom, inofensivo, protegendo a mulher. Você pode levar o que quiser, só não faça nada com a gente. Fiz com a mão sinal para ele fechar a porta. A Ângela atrás dele me olhou com aqueles olhos redondos, negros, lindos. Seus olhos diziam calma, Miguel, calma. Vou só roubar e ir embora, falei. Não vou fazer mal a ninguém. Pro banheiro, eu disse, firme, e com a arma apontei o corredor.

Ele foi caminhando aos tropicões, estranhamente protegendo a Ângela. Tirem os sapatos e entrem no box, ordenei. Ele me olhou e pareceu relutar, vi uma dúvida na sua cara, um leve franzir de sobrancelhas. Vamos, vamos!, eu disse.  Descalçaram os sapatos e entraram. Você, eu disse pra ele, tire toda a roupa. A moça não precisa. Quero garantir que você não vai sair correndo atrás de mim, conclui, para tranquilizar o homem.

Para meu espanto ele se despiu por completo, rapidinho, até a cueca, como um menino faria para correr e pular no lago. Deixou um bolo de roupas no chão. Chute as roupas para cá, falei. Ele chutou e o bolo todo que caiu na minha frente. O senhor leve tudo o que achar, não daremos queixa, pode fechar a porta do banheiro se quiser, não sairemos daqui até amanhã. O peito magro dele subia e descia, ofegando de medo, uma mão cobrindo o pau e a outra segurando o braço da mulher.

Daí em diante a coisa foi tão rápida que nem me lembro dos detalhes. Estiquei a mão para a Ângela que correspondeu segurando a minha. Puxei ela pela ponta dos dedos, como um cavalheiro que ajuda a garota a saltar uma poça depois da chuva. Ela veio num pulinho elegante, aterrissando do meu lado.

Acabe logo com isso, bem, ela disse, e passou por mim sumindo pelo corredor em direção à sala. Ele olhou estupefado para as costas da Ângela, depois para mim, depois novamente para o corredor já sem Ângela, o terrível sopro da dúvida  impresso nos seus olhos, arregalados, as ideias se conectando ali dentro da sua cabeça de maneira furiosa. Quando pareceu que ele iria abrir a boca e dizer alguma coisa, disparei. A arma fez um ruído mínimo, um cuspe. A bala entrou pelo olho direito, na exata junção entre olho e nariz . A cabeça dele foi para trás e ele desabou reto, como um prédio implodido. Estrebuchou no chão por uns segundos, o olho que sobrava arregalado. Então morreu. Conferi os azulejos atrás dele. Intactos. A escolha do calibre 6.35 foi acertada. O projétil não atravessou o crânio.

O sangue começou a descer. A Ângela ficou na sala, sentada no sofá. Pronto?, ela disse. Agora é que a coisa vai começar, falei, e fui buscar a caixa com as coisas na área. Tirei toda a minha roupa. Fiquei só de cuecas e entrei no box. Me abaixei junto ao corpo e, com uma faca afiada, fui perfurando pontos específicos. Barriga, uns quatro furos. Pescoço, cortei a carótida e a jugular. Cortei também a artéria femural através da coxa. Depois, aproveitando os furos na barriga, abri o ventre longitudinalmente e liberei um pouco dos intestinos. Fiz mais umas 12 perfurações, cirúrgicas.

O sangue foi descendo grosso pelo ralo, diluído pela água do chuveirinho, que abri no máximo. Cinco, seis litros de sangue para 100 litros de água a cada 5 minutos é brincadeira de criança, vira uma groselha, e depois que atinge o esgoto, acabou-se. Some. O esgoto é definitivamente o destino mais adequado para um corpo quando não se quer deixar vestígios.

Lembro de um filme que vi quando era moleque. Os bandidos derretiam as pessoas numa banheira com ácido. Porra, em filme tudo é fácil. Onde achar um ácido que derreta um cara todo?

Com o pequeno serrote, separei as pernas da bacia e depois separei-as em três, na altura dos joelhos e depois os pés. Serrei o pescoço separando a cabeça. Muito difícil. Braços soltos, dividi em três como fiz com as pernas. Abri a barriga inteira, e a caixa do tórax estourei com o peso do corpo, pisando. Levantei a tampa de carne do peito e fui liberando os músculos até chegar às costelas. O senhor não me faça esse ar de nojo, por favor, vim para mostrar que apesar disso sou um homem bom e correto, e sei fazer justiça, ainda que tardia.

Na semana anterior eu tinha comprado o liquidificador industrial de 10 litros. O cara me garantiu que era poderoso, podia moer até pedra. Comprei também um bico-de-papagaio e uma chave inglesa com um torque e tanto. Um martelo de ponta, tipo cinzel de escultor, e um mini-serrote. No motel, na tarde do dia seguinte, entreguei pra ela a caixa com as coisas e expliquei: você tem que guardar isso num lugar que ele não mexa. No alto do armário da área, ela disse. Ele nunca, em quinze anos de casamento, abriu um armário da área de serviço. Se ele achar você não vai ter o que dizer, alertei. Não tem a menor chance, ela disse, fica tranquilo, bem.

O rigor mortis começa a se instalar no corpo do defunto uma hora após a morte. Até uma hora o corpo ainda é macio como quando a pessoa está viva. Claro que isso depende do tipo de morte. Mas era esse o tempo que eu precisava para as separações principais, que na verdade fiz em menos de 45 minutos. Os ossos maiores fui esmagando com a chave inglesa, depois batendo, com cândida e água, junto com pedaços de carne e órgãos no liquidificador. Pensei que o cheiro seria pior. A cabeça parti com o cinzel de ponta. Os miolos bati com facilidade, o crânio desmanchei nos encaixes usando o grifo, depois bati os pedaços junto com os intestinos, para não correr o risco de danificar a hélice. Os ossos da bacia e o fêmur deram muito trabalho, enchi a mão de calos para quebrar cada um em pedaços pequenos.

Levei das 17h até às 21h para fazer o corpo do Edgar virar sopa cremosa de carne e descer esgoto abaixo, pela privada. O liquidificador esquentou bastante, mas deu conta. Depois lavei o box todo e todos os instrumentos. Primeiro com detergente, depois com cândida, no capricho. No fim tomei um longo banho sentindo as costas e os braços latejarem, moídos.

As 22h a Ângela chamou comida chinesa pra gente. Comemos em silêncio e depois fomos dormir, exaustos, mas livres pela primeira vez. Ninguém mais baterá em você, meu bem, eu disse a ela antes de pegarmos no sono, eu com o nariz metido nos seus cabelos cheirosos.

Na segunda saímos cedinho, eu dirigindo, de luvas, vestido de Edgar, com uma camisa do Edgar, sapatos do Edgar, os óculos escuros do Edgar e o aceno sério do Edgar por detrás do vidro filmado do carro. Absolutamente Edgar.

Naquela manhã, 16 de março de 2009, deixei a Ângela no trabalho e peguei a Anhanguera no sentido interior. Ali pelo quilômetro 40, altura de Cajamar, entrei numa estradinha secundária e, 10 quilômetros adiante, larguei o carro numa rua de terra. Saí andando. Nenhuma alma viva por perto. Os sapato dele tirei e calcei um par novinho em folha, virgem, que levei só para isso; enfiei os velhos na mochila, junto com as peças esterilizadas do liquidificador, o serrote e o cinzel. Uma hora depois joguei tudo numa caçamba de entulho lá na Lapa, perto do Mercado Municipal. As luvas numa lixeira, perto da estação de trem.

A Ângela só pôde registrar a queixa oficial do desaparecimento dele na manhã da terça, ordens da polícia, que a mandou de volta pra casa na noite daquela própria segunda, desesperada, depois que o marido não voltou para casa e de saber que ele tampouco apareceu para trabalhar. Os investigadores, no distrito, tiveram que dar pra ela um copo de água com bastante açúcar. Coitada.

Não deixamos vestígios. Foi tudo tão bem feito que mesmo que eu quisesse não conseguiria, dois anos depois, provar sozinho que fizemos isso tudo. E a Ângela se recusou a dar este depoimento junto comigo. A minha ideia era a gente fazer uma confissão conjunta, assim pagaríamos dignamente pela injustiça que cometemos, mais ela do que eu, que me fez acreditar que ele era um marido mau e violento, e na verdade ele era uma moça de gentileza, apaixonado por ela, dedicado. Ainda me lembro dos olhos dele me olhando de dentro daquele box. Olhos bons.

Frente a isso doutor, a essa recusa dela, fui obrigado a trazer ela aqui hoje, na marra, para garantir que a justiça seja feita. Só assim o senhor poderá acreditar no que eu digo. A Ângela está lá no carro, peça para que dois rapazes fortes a busquem, por favor, aqui está a chave. Não, não, ela não está amarrada. Coloquei-a no porta-malas, dentro de duas bombonas plásticas de 30 litros.
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Cesar Cruz
Maio 2011
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15 comentários:

Gabriel Fernandes disse...

Sensacional.

Percival Deimann disse...

Cada vez melhor:
"...para fazer o corpo do Edgar virar sopa cremosa de carne e descer esgoto abaixo..."
Muito bom!!

Anônimo disse...

Nossa , realmente virei sua fã , rsrsr estava ansiosa por novos textos , valeu a pena esperar esse conto

stheffania

Anônimo disse...

show, quantas vezes assistiu jogos mortais?...rs
legal. abraços. bom final de semana a todos.

xara - ipiranga - sp-sp

Gabriel Fernandes disse...

Oi, meu amigo.

Com relação ao seu “Acabe logo com isso, bem!”, eu quis matutar um pouquinho antes de alinhavar uma avaliação.
As leituras que você tem feito têm lhe feito bem. Você amadureceu pra cacete, está adquirindo estilo e seus textos são cada vez melhores.
Este Acabe... é uma joia. Fluido, consistente, homogêneo. Gostei do vocabulário, compatível com o status do narrador, da extensão das frases, da escolha da forma (que eu sei de onde você tirou), do desenvolvimento do enredo, da trama.
Não ficou pesado, apesar do “peso” do tema. Não há palavras chulas desnecessárias, não houve apelação. Perfeito. Melhor do que a maioria das coisas que você lê e me empresta para que eu leia. Você aprendeu a escrever com qualidade e isso fica evidente nos seus textos mais recentes.
Parabéns. Estou supercontente.

Abração,
Gabriel

Anônimo disse...

Estou chocada Cesar!!!
Adoreiiiiii!!!

Anônimo disse...

"O senhor não me faça esse ar de nojo, por favor...". Nooossa! Nessa parte tive uma explosão nervosa de riso. Ri com os olhos arregalados e a testa suando. Demais! Forte e convincente, no estilo do Rubem Fonseca.

bjo
Mariana

Paulo Neto disse...

lido,

sensacional a cadência deste conto. Perfeito!!!

Paulo

Darwin Bruno disse...

Muy interesante la Historia amigo.Me gusto tu Blog. Te envío un saludo fraterno. Seguiré visitándote con tu permiso.

http://socialculturalyhumano.blogspot.com/

Vagner Barbosa disse...

Gostei! Está muito bem urdido, num tom sensacional. Parabéns. Mesmo!!!
Você assistiu “reflexões de um liquidificador”? Creio que não...assista, você vai se espantar!

Vagner

Caca disse...

Cesar, meu amigo! Você está cada dia melhor. Que trama bem urdida, que narrativa fluida, envolvente, cheia de suspense e derradeira. Me senti como se diante de um Alan Poe e um Rubem Fonseca. Mas é o César com estilo próprio e muito adorável.

PS: Obrigado pelo apoio e solidariedade diante de minha perda inestimável.
Abração. paz e bem.

Thais Petranski disse...

César!
Acabo de pegar o Jornal da Aclimação para ler e meus olhos pararam em : Eis-me aqui.
Achei muito divertido, é muito parecido que escrevi ontem mesmo pra um amigo meu. no fim li: César Cruz. Tenho um amigo mexicano chamado Cesar Cruz, mas com o blog "oscausosdocruz" só poderia ser você mesmo!
Caraca quanto tempo! Fiquei muito feliz ao xeretar seu blog agora e descobrir que lançou um livro! Quero ler seu livro! Onde posso encontrá-lo? Eu lancei um livro infantil o ano passado, e tenho disponivel no site Clube de Autores um outro livro, com mais três projetos em fase de espera (para ver se publico ou não).
Agora estou seguindo seu blog! Parabéns pelo livro e pelas crônicas! bj, Thais

Natália Cassiano disse...

Que ótimo conto!
Adorei a forma do seu personagem descrever o crime.
Confesso que fiquei tentando adivinhar o final enquanto estava lendo. Sabia que coisa boa não iria acontecer com a mulher.
Já pensei nisso também, como se livrar de um corpo sem deixar pistas (não que eu precise haha). A gente vê nos filmes, o assassino sempre deixa rastros. Muito engenhoso.

Abraços
Deva

Celêdian Assis disse...

César, simplesmente espetacular a sua narrativa. A condução temporal, a temática dramática com riqueza de detalhes, o perfil psicológico dos personagens delineado com requinte em entrelinhas sugestivas, o desenvolvimento da trama, tudo narrado com muita destreza. A introdução e a conclusão perfeitamente harmonizadas. Realmente excelente. Gostei muito.
Um abraço,
Celêdian

Carla Fernanda disse...

Olá!
Passando para uma visita de final de semana!
;D
Carla