A Lagartixa

 
Crônica publicada no Jornal do Cambuci & Aclimação
Crônica publicada no Portal Mundo Mundano
Agosto 2011.
---------------------------------

eitado, vejo a lagartixa. Não imagino como ela fez para entrar aqui, o fato é que entrou e, enquanto eu lia, na penumbra do abajur, apareceu próxima à cortina.

Uma vez quando eu era menino encontrei uma lagartixa morta, virada de barriga pra cima. Olhei de perto e me espantei de ver que a barriga da lagartixa é semitransparente, possibilitando a gente ver tudo lá dentro, os órgãos, tudo.

E agora estou aqui, vendo a lagartixa.

Deve-se matar as lagartixas? Meu pai dizia que não. Me ensinou que elas são amigas da gente, comem os insetos, são limpas  não andam nos esgotos como as baratas  e não incomodam, ficam sempre no alto. Como aquela ali, que acabou de dar uma corridinha fazendo aqueles eSSes que as lagartixas fazem com o corpo quando correm.

Agora ela está justamente em cima da Vanessa, que é uma pessoa que definitivamente não compreende as lagartixas, e que dorme sem nem supor uma barbaridade dessas. E se a lagartixa despencar do teto será uma gritaria danada, e já são... deixa ver... meia noite e quarenta e dois.

E ela agora correu de novo, contornou o lustre e parou do outro lado. Interessante é o modo como as lagartixas estancam a carreira, já reparou? Conseguem parar instantaneamente, melhor do que qualquer animal ou carro. Têm bons freios, as lagartixas!

Penso que posso ir até a lavanderia pegar um balde, depois subo na beiradinha da cama e, com uma folha de papel canoada, jogo a lagartixa para dentro do balde, e então será só colocá-la lá fora. Porém, se eu sair daqui para buscar o balde, a lagartixa poderá sumir e eu ficarei pelo resto da noite pensando que ela terá caído na cama e estará no meio dos lençóis, dentro da fronha; sem falar que a movimentação toda poderá acordar a Vanessa, que me surpreenderá em pé na cama, pelado, com um balde na mão, e, sonada, sem entender nada, quando eu lhe disser é “só uma lagartixa, amor”, dará um pulo daqueles e um berro pior ainda e acordará meio mundo, e depois não dormirá mais achando que as lagartixas assassinas podem ter entrado às centenas no quarto e... enfim, a minha noite viraria um inferno.

Se eu fosse uma lagartixa, gostaria de saber que dei a sorte de entrar na casa de um homem bom e preocupado, cujo pai ensinou que não se pode fazer mal a elas. Agora ela correu de novo e está sobre a porta, próxima à junção entre teto e armário embutido. Ocorreu-me que se eu não pegar a lagartixa, ainda que seja para depositá-la carinhosamente lá fora, daqui a pouco ela vai sumir e eu não saberei mais a que hora incerta de um dos próximos dias poderei tomar uma lagartixada gelada na careca.

Quanto tempo vive uma lagartixa escondida num quarto?

Bom, o fato é que eu não sou uma lagartixa, e a ideia ridícula de que ela poderia estar achando que sou um cara bom e legal, essa ideia besta me faz perceber que estou com sono e já começando a ficar irritado com essa lagartixa impertinente que adentrou o meu quarto sem prévia autorização, com sua asquerosa barriga transparente a esfregar aqueles intestinos de lagartixa por todo o meu teto, e isso me faz ver que não, não preciso ser consciencioso com este ser, e pretendo agora mesmo, antes que a Vanessa acorde  porque ela já está se mexendo muito, talvez pressentindo algo , me erguer daqui e dar uma boa chinelada nesse pequeno dinossauro folgado e jogá-la na privada, e que seu Aloisio me desculpe, mas tenho sim uma grande superioridade física e intelectual sobre ela e, opa, só que... ãn... correu... Ih, ela correu e... Se enfiou num pequeno vão entre o teto e a moldura do armário... Mas sobrou um rabo e...!

Sumiu.
.
.
Cesar Cruz
Julho 2011
.
.
.
.

16 comentários:

Caca disse...

hehehe! Nesse aspecto "asco" ou medo, as mulheres são absolutamente iguais. Aqui na minha casa elas são companhias diárias (melhor, noturnas), mas se entrar uma no quarto, enquanto eu não for lá expulsá-la, minha mulher não dorme e ainda não me deixa dormir, falando, chorando, berrando. hahahha!

Semana passada eu fui a um lançamento de livro infantil e a autora fez um livro chamado A Lagartixa Voadora. Foi a forma que ela encontrou para espantar o seu pavor diante de uma cena como esta sua. Aí ela inventou asas para o bichinho (fez uma meia terapia) e transformou em histórinha infantil. hahahaha! Ótimo, Cesar! Abração.

PS: aqui a gente chama de Taruíra. Lagartixa a gente chama aqui o que provavelmente vocês chamam aí de Calango.

Vanessa Cruz disse...

Qdo foi isso? E vc não me contou nada?! Essa noite terá que vistoriar todo o quarto. Odeioooo tudo que se parece com dinossauros.

Marcelo Lopes disse...

Fala Cesinha,

Aqui não temos este problema. Acho que é porque as lagartixas não sabem pegar o elevador, ou ainda por ser cansativo demais subir os 13 andares até meu apartamento.
O lado bom disso é que as baratas também não sobem...rsrs

Grande abraço!

Marcelo

Anônimo disse...

Muito bom!!!

Eu também não ligava e pensava que eram seres pacíficos, até que uma me acordou no meio da noite, gelada pulou em meu braço, eeeeeeeeeeeca...

Procura por aí, não deixa ela solta não...

Beijos,

Lena

Anônimo disse...

Só não entendi o comentário da Vanessa... odeia tudo que se parece com dinossauro e se casou com você??? Estranho...
Beijos a todos, Marcão.

Mari disse...

eu tenho PAVOR de lagartixa! PAVOR! se uma aparece no meu quarto eu não sossego alguém ir lá tirar! Em compensação, não permito que mate a coitadinha, pq né... Vá entender!

Anônimo disse...

Vanessa, se odeia tudo que se pareça com dinossauro então torça para estar dormindo quando o Cesar estiver pelado na cama com um balde na mão, se bem que, se a lagartixa o visse assim ela própria acionaria uma espécie de turbo que escondem e iria imediatamente embora...rs
brincadeira tá? ainda amigos? Cesar, vai postar esse comentário?

Thais Petranski disse...

As lagartixas são tão fofinhas!!rsrsrs Aqui vivemos salvando as que aparecem dos meus gatos assassinos... NÃO VÁ ARRUMAR UM GATO EXTERMINADOR! Seria uma péssima idéia! :)

André Whitaker Salles disse...

Até hoje sinto pena de uma lagartixa que eu matei quando moleque... ela gritou e depois eu enterrei... tadinha.

André

ROSANA COSTA disse...

UIIIIIIIIIII...QUER SABER TENHO PÂNICO DESSE BICHINHO...DESCULPA INVADIR O SEU BLOG...ACHEI O ASSUNTO INTERESSANTE..RSRSRS SE PERMITIR SEREI A SUA SEGUIDORA...UM FORTE ABRAÇO E SE QUISER DA UMA PASSADINHA NO MEU BLOG...FIQUE A VONTADE VOU ADORAR TÊ-LO COMO MEU SEGUIDOR.

Therezinha Eunice disse...

oi

sobrinho adorei, um comentario a Tabata gosta de tirar o rabo das laqartixa,

beijos

tia

Tais Luso de Carvalho disse...

Cesar, também me criei ouvindo que não se mata lagartixa. Elas comem os insetos e blablabla. Tudo bem, não mato, mas não fico em paz enquanto não colocá-la para fora. Lugar de lagartixa é na rua!! Se este bicho pular em mim... Enfarto!
Seu drama me deixou preocupada... mas comigo!

Beijo
Tais Luso

Gabriel Fernandes disse...

Perfeita! Haja inspiração! Você não dorme, meu?
Abraço.

Lourisvaldo Santana disse...

Oi,Cesar!
Impressionante a sua descrição e narração. Faz a gente se sentir ao seu lendo e se arranjando para fazer sumir a lagartixa.

Abraços!

Anônimo disse...

Não tenho medo de lagartixas, mas o rabo se mexendo sozinho depois de cortado é de amargar... Só por isso merecem morrer. Beijos, Yeah.

Percival Deimann disse...

Caro Cesar, faça por gentileza uma crônica da mesma situação sob a ótica da lagartixa.
Seu sempre leitor