Lá no fundo do relógio está a morte
Julio Cortázar
Tocou meu telefone celular numa certa tarde. Atendi.
— Alô?
— Oi, meu amor, liguei para saber se vocês vêm almoçar no domingo com a gente?
— Quê...?
— É que seu pai e eu estamos com muita saudade de vocês e da nossa netinha! E ele até prometeu que se você vier vai fazer aquela caipirinha que você adora, e depois quer te mostrar umas coisas no carro!
— Olha...
— Ah, lá vem você com desculpa! O problema é que vocês dois só trabalham! Eita povo que trabalha tanto! Eu falo pro seu pai que vocês têm que arrumar um tempo pra família, viu? Amanhã a gente morre e vocês vão lamentar.... Olha, se vocês vierem, depois do almoço a gente podia assistir a um DVD, já que está fazendo esse friozinho.
— É que...
— Ah, filho! Vem, vai? Olha, se você confirmar que vem faço aquela torta de batata com carne moída que você adora, e também bifes a role! Não é possível que você não está com saudades da comida da sua mãe?
— Oh, sim, muita...
— Então! Não vá me dizer que não pode, que vocês tem sei lá que compromissos...
— Olha, eu adoraria, acredite...
— Pronto! Liga lá pra Soraia e fala que eu disse que não aceito não como resposta! Vai, liga já!
— É que está havendo um engano, senhora.
Instante de silêncio do outro lado da linha
— Eu não sou o seu filho.
— Daniel? Não é você?
— Não.
— NÃO?! E quem é então?
— Meu nome é Cesar...
— Oh, meu Deus... Me desculpe meu bem, eu devo ter discado errado... E você tem a voz tão parecida com a do meu filho. Ah, mas você deve ter mãe e sabe como as mães são avoadas.
— Claro que sei. Minha mãe era assim também, como a senhora. Mas infelizmente ela morreu, e meu pai também...
— Oh... eu sinto muito.
— Não tem problema. A senhora faz assim: liga pro Daniel agora e diz que eu mandei dizer pra ele aproveitar, aproveitar enquanto pode.
— Não é verdade? Eu digo sempre isso pra ele!
— Sim, a minha mãe também sempre me dizia, mas a gente não ouve, sabe? A gente só entende depois que perde.
— Eu digo pro Daniel, eu digo!
— Hoje eu daria qualquer coisa para ter só mais um almoço de domingo com a minha mãe e com meu pai... Então, por favor, a senhora fala pra ele que eu mandei ele confirmar esse almoço! E não precisa nem consultar a Sofia...
— É Soraia...
— ...e se ele não puder a senhora me liga que eu vou.
— Eu digo pro Daniel, eu digo!
— Hoje eu daria qualquer coisa para ter só mais um almoço de domingo com a minha mãe e com meu pai... Então, por favor, a senhora fala pra ele que eu mandei ele confirmar esse almoço! E não precisa nem consultar a Sofia...
— É Soraia...
— ...e se ele não puder a senhora me liga que eu vou.
Cesar Cruz
Setembro 2011
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17 comentários:
Sensacional! Fiquei sem palavras.Se você não quiser ir, me avisa que eu vou.
Abraço,
Gabriel
Você está de brincadeira comigo que isto aconteceu de verdade? Imaginei a situação, ahuahuahuhau!
Bj
Regina
Muito boa Cesar ... Adorei!!!!
Mara
hahahahaha! Você é ótimo, Cesar. Quase ganha uma nova mãe. hahahaha! Abração.
Pô Cesinha,
Essa foi brincadeira, hein cara...uma mistura de sentimentos: a vontade de rir da situação sendo refreada pela reflexão...avisa antes se é conto ou crônica!! rsrs
Grande abraço!
Curto e real!
Lindo, lindo, Cesar!!! Eu ADOREI!!!
Me deu uma vontade de ver a minha mãe, vc tem razão, somos relapsos e só damos valor depois que perdemos.
Incrível como vc conseguiu dar aquele puxão de orelha na gente com uma crônica deliciosa, engraçada e muito criativa! Parabéns!
Vou seguir seu conselho, mas também vou mandar por email aos meus filhos hahaha
Um grande abraço.
Sueli Gallacci
Que belo conto!!! Parabéns meu jovem...
Maria Eliza
Aff que lindo!
Ei que tal você e Vanessa virem almoçar com a gente um domingo desses? Vamos parar de trabalhar e marcar?
Beijos
Glau
Show
Coincidencias a parte, quando a minha "Soraia" pensa em me convidar a comer na casa dela, já estou lá, considerando a mão santa que a "Sogrinha" tem, eu próprio me convido. Falando mais seriamente é bem verdade, duas semanas atrás meu pai fez 80 anos (mãe viva tabém, privilégio, admito) fizemos uma festança que superou em muito as expectativas (eu e mais 5 irmãos), portanto quem ainda os tem, aproveitem mais do que possam, vale e valerá a pena.
abcs
xara - ipiranga - sp-sp
Bravo!
Sua crônica está impecável, Cesar.
Sua mensagem, por certo, atingirá muitas pessoas, que estão se esquivando de um bom almoço (ou jantar) com os pais.
Felizmente ainda tenho mãe, e sei como sua presença é importante. (Meu pai morreu há seis anos, mas faz muita falta!)
Grande abraço,
Pedro.
kkkkkk, olha, depois deste papo todo, eu iria mesmo com o filho Daniel! Era só mais uma conversada... Ela já estava com o convite na ponta da língua! Seria mais uma amizade, mais uma alegria de mãe...kkk
Muito boa; crônica leve, gostosa de ler.
Beijo
Tais Luso
Mto bom!
Desejo que o Daniel tenha entendido o recado
Você tem razão, a gente não dá valor aos pais qndo eles estão ali, pertinho da gente.
Vou ver se assisto um filminho com os meus amanhã... Boa influência a sua.... rsrs
Bjo
Sensacional!
Mara RUzza
Lindo! Amei.
Bj, Yeah
Show!! Não sei se rio ou choro...emocionante! bjs.
Muito legal, gostei bastante!
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