Crônica publicada no Jornal do Cambuci e no livro A Idade do Vexame & Outras Histórias.
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A Michele me comove de forma especial. Emociono-me ao olhar para aquele seu pequeno rosto, liso, redondo, sorridente. Sentir aquele seu cheiro de criança, de inocência, aquele cheiro tão bom. Parar para apreciar aquelas suas mãozinhas gordinhas, curiosas, que em tudo mexem; aquela sua expressão doce, aquele seu dedo que vive na boca... Não chupe o dedo, filha! Puxo seu dedo repentinamente e ela ri pra mim. Ri um riso que eu sou incapaz de descrever a você como é... O riso do filho da gente.
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Dia desses, a amiga Tais Luso, escritora também, dirigiu-me um email que dizia: “Cesar, escreva mais coisas bonitas como essas"
As coisas bonitas a que a Tais se referia são os textos que escrevi sobre a minha filha Michele. Lendo o email da Tais, fiquei pensando que bonitas mesmo são as coisas que ocorrem dentro de mim quando olho pra carinha da minha filha, quando penso nela durante o dia, quando a observo dormindo, naquela paz que para mim caracteriza toda a plenitude da inocência dos ingênuos.
Perto disso, as coisas que escrevo não significam nada. São insípidas e inodoras, tamanha a distância que têm do real sentimento que as produz. É então que compreendo quão incapaz sou para materializar essas inexplicáveis emoções, inapto para transformar em letras e frases esse meu imenso amor. E isso é duro para um escritor.
Nos dias em que escrevia este texto, por uma incrível coincidência, dei com um poema que me consolou. Descobri que não estou sozinho na dificuldade de expressar certos sentimentos. Há companhia ilustre! Veja o que escreveu Fernando Pessoa:
O que sinto, na verdadeira substância com que sinto
É absolutamente incomunicável
É absolutamente incomunicável
E quanto mais profundamente o sinto
Tanto mais incomunicável é.
“Absolutamente incomunicável", seja para os mestres, seja para os pobres mortais.
Mesmo consciente desta incapacidade, me sinto compelido a falar, escrever, bradar! Quero poder dizer a você que me lê, que aquele pequeno pedaço de chocolate que dorme ali naquele berço (enquanto escrevo este texto aqui no sofá da sala), naquele quarto, cobertinha com sua mantinha, sob os cuidados da gente, como eu poderia imaginar, ou ao menos supor, que pudesse impactar tanto a minha vida?
Só sabe quem vive... Alguém já disse isso, e é um fato. Só compreende verdadeiramente as coisas quem passa ou passou por elas, seja o que for.
O louco amor que um homem tem pelo seu filho, quem não tiver um filho jamais compreenderá. Estou convicto disso, pois até pouco tempo eu mesmo achava que sabia como era.
Não sabia.
A Michele me comove de forma especial. Emociono-me ao olhar para aquele seu pequeno rosto, liso, redondo, sorridente. Sentir aquele seu cheiro de criança, de inocência, aquele cheiro tão bom. Parar para apreciar aquelas suas mãozinhas gordinhas, curiosas, que em tudo mexem; aquela sua expressão doce, aquele seu dedo que vive na boca... Não chupe o dedo, filha! Puxo seu dedo repentinamente e ela ri pra mim. Ri um riso que eu sou incapaz de descrever a você como é... O riso do filho da gente.
Quem é pai me entende, acho. Às vezes acho que não. Nesses momentos que acho que não, acho que não, pois julgo que meu amor pela Michele é o maior amor do mundo, e que ninguém tem um igual ao meu. Isso deve ser injusto da minha parte. Não tenho de fato como medir o amor dos outros pelos seus filhos.
O que sei é que ergo a minha menina no colo e algo se enche dentro de mim! Surge uma bolha de inexplicável contentamento e plenitude, enorme e morna. Acho que é isso o amor. Essa sensação física de preenchimento, de quase não caber dentro de si próprio.
Então quero beijar e apertar a Michele, mantê-la nos meus braços, espremida num abraço sufocante para senti-la colada a mim. Não quero mais soltar. Dá um nó na garganta e um amor tão grande no peito, que chego a chorar um chorinho disfarçado, sem ninguém ver.
Nessas horas, quem acaba chorando é ela, coitadinha, porque o papai apertou demais.
Cesar Cruz
Outubro 2009
N/A - O poema do Pessoa é do "Livro do Desassossego", assinado pelo seu heterônimo Bernardo Soares, ajudante de guarda-livros na cidade de Lisboa.
15 comentários:
Pai babado :-)
Parabens pelo bonito texto e pela linda flor que Deus quis lhe dar.
Felicidades
A D O R E I!!!!
Eu ja vi o papai apertando demais mesmo hahahah!!!
Bj
Ana Zappi
Olá Cesar,
É facil idealizar um amor e dele falar. Mas quando lidamos com sentimentos verdadeiros os quais não queremos enfeitar, querendo apenas que brotem naturalmente realmente fica difícil.
Acho até que involuntáriamente,somos egoista e queremos este amor apenas para nós mesmos.
Bom, o dia da criança se aproxima e nada mais gratficante que ver um pai declarando seu carinho seu amor ao fruto do seu amor.
Carinhosamente,
Dalinha
é isso aí cesar, costumo dizer a todos que o amor que sinto pelo meu filho Lucas (apelido negão e hoje com 13 anos) é nada mais do que o amor que um dia terei de sentir por toda a humanidade, simplesmente por ser pleno.
abraços
xara - ipiranga
Oi César, lindo suas declaracao de amor!... nao sei porque vc pensou que seria facil descrever esse sentimento com palavras...mas todas as tentativas nesse sentido sao validas...e tem mais, ainda dizem que o amor de mae é diferente do maor de pai sera?
É meu caro, é isso tudo e muito mais... eu sei que você sabe disso...., mas o lindo de todo esse sentimento, é que ele não se divide nunca.... Cada filha que eu tive (e tive 3 como vc bem sabe), eu temia, antes de cada uma delas nascer, nossa nunca vou amar esta que vai nascer tanto quanto a que já está aqui, e quando nasce ....voilá....aquele amor se multiplica de tal forma que você pensa, pensei que no meu coração não havia mais lugar... e não havia mesmo, mas o coração da gente é mestre de obras, vai fazendo um puxadinho aqui, outro acolá... e vai cabendo todo mundo na mesma intensidade...
Respeito os que não têm filhos por opção... mas no fundo me vem um dó de saber que eles não sabem o que estão perdendo.
Alguns sentimentos, não foram feitos para explicar...amor aos filhos é um deles, diferente de amor de casal, que é cheio de dores e dúvidas em seus momentos...Amor de Pai ou Mãe... é .....hsdajhihdnbjusd...jkhsduihbdk...entendeu?!!
Baxo
Cesar: andando pelo teu blog, descobri, entre tantos textos bons, uns que me chamaram atenção por passarem emoção, amor e dedicação dispensados a uma criança; à Michele, tua querida filha. Realmente, Cesar, nos dias de hoje passar estes sentimentos através de um computador, não é tarefa fácil.
Achei lindo esse texto e os outros que falas dela. Agora, não venhas me dizer que não sabes passar tais sentimentos! Ô, César...
Sabes por que me emocionei? Porque nos dias de hoje, entre tantas desgraças, entre tanto egoísmo, entre tantas coisas que poderiam ser dispensadas, nos agarramos a elas como salva-vidas e esquecemos o que realmente tem valor: o afeto e o carinho dispensados a nossos filhotes. Que criança feliz deve ser a Michele; foi a escolhida.
Guarda tudo, todos esses escritos para quando tua filha alcançar a idade da compreensão saiba que pai amoroso e dedicado ela teve. Meus pais guardaram tudo que escreveram quando eu nasci, e sei, há muito tempo, o tanto que fui amada. E isso serviu para que eu trilhasse o caminho com segurança. Amor é tudo.
Parabéns a ti e tua esposa. Escreve sempre o que teu coração mandar.
Um beijo carinhoso à Michele.
Esses links do Cesar vale a pena:
http://oscausosdocruz.blogspot.com/2009/05/os-olhos-dos-outros.html
http://oscausosdocruz.blogspot.com/2008/09/xxx.html
bjs
Tais luso
Ei César.... Esse amor é algo que por mais que escrevamos , não conseguiremos que ele caiba nas palavras.. transcende.
Vou comprar o livro do Rubem Alves sim, obrigada pela indicação.
Bjs
oi
adorei o seu amor de pai, filho e uma dádiva de Deus,
beijos
tia
Meu amor, fiquei emocionada com o texto, pois o que sentimos por nossa Michelinha é exatamente isso " O maior amor do mundo" imensurável, indescritível, mas como vc é muito bom conseguiu colocar em algumas palavras um pouco do que sentimos por nossa pequena...
Você sabe disso pq sempre te falo, que a Mi tem muita sorte de ter um pai como vc! Tão amoroso e tão dedicado... E nós então, nem se fala, em termos uma filha maravilhosa como ela!
Amo vc's demais...
Beijos
OI CESAR
EU LI O TEXTO.ACHEI LINDO MESMO!!!! ESSE AMOR, SÓ QUEM TEM SEUS FILHOS É QUE SE IDENTIFICA COM O QUE VC ESCREVEU!!!!!!!AMOR INCONDICIONAL....PRA SEMPRE!!!!!
AMOR TOLO, SUFOCANTE, EXAGERADO E PURO QUE SÓ A GENTE ENTENDE!!!!!!
BEIJOS
FERNANDA
Cé,
Entendo muito bem essa agonia de não alcançar a expressão que diga isso que sentimos, porque venho procurando uma palavra assim desde que nasceu a minha "chocolatinha branca" e não a encontro também.
Agora, você quer saber se ela te ama como você a ama? É claro que não! Só sua mãe e seu pai te amavam assim e a Michele só amará nesse tanto os filhos dela.
É isso aí, meu amigo... Somos,daqui pra frente, uma fonte inesgotável de perdão, assim como foram para nós nossos pais.
Lindo! Chorei!
Beijo, Yeah.
Ahhhhh, mas deu uma saudade da minha favorita! Uma das meninas mais lindas do mundo!
Entendo o seu sentimento, me pego olhando o povinho daqui dormindo e pensando o tanto que eu falho com eles e o tanto mais de amor que eles merecem!
Cesar,
É isso mesmo. É tanto amor que transborda e a gente não tem palavras... Mas você conseguiu, pelo menos para nós que o lemos, passar o seu amor e encantamento com a Michele.
Será assim para toda a vida. O Tomás tem 15 e continuo babando.
Beijos,
Cesar,
Você citou Fernando Pessoa para justificar a sua pretensa incapacidade de expressar o seu amor pela Michele, o que seria desnecessário, não pela "presença" do grande poeta lusitano, mas porque esse nobre sentimento paterno foi sentido por quem leu "O maior amor do mundo", em homenagem à sua filha.
Uma bela crônica, sem dúvida.
Um abraço.
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